sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Histórias Secretas de Playboy: Adriane Galisteu

Histórias Secretas de "Playboy": o dia em que Adriane Galisteu se depilou, na foto mais polêmica da história da revista

O premiado jornalista Ricardo Setti foi diretor de redação de "Playboy" de 1994 a 1999, um período muito rico, que deu resultados muito positivos para a Editora Abril e rendeu muitas histórias que ele nunca contou. Pois bem, recentemente, resolveu divulgar as “histórias secretas” da revista Playboy no seu blog http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti. O texto que segue foi inteiramente baseado no seu blog. 


A capa do 20º aniversário de "Playboy" com Adriane Galisteu na Grécia 

"O fotógrafo J. R. Duran ficou preocupado quando ele e a equipe de Playboy chegaram à ilha de Santorini, na Grécia. Apesar de ser um consumado globetrotter, sem contar que estava prestes a realizar o 107º ensaio fotográfico para a revista, era sua primeira vez na ilha, e ele não gostava do que via.

A estrada que saía do acanhado aeroporto mostrava uma paisagem pedregosa, desértica, absolutamente destituída de atrativos. E ele carregava a responsabilidade de fotografar para a edição de 20º aniversário da revista – e no mais glamoroso cenário possível – a mulher mais comentada do país na época: Adriane Galisteu, a última namorada do supercampeão de Fórmula-1 e grande ídolo brasileiro Ayrton Senna, morto no ano anterior, 1994". 

O processo de negociação 

"Playboy havia investido meses de trabalho e uma grande soma em dinheiro para conseguir contratar Adriane. 

No processo de negociação, seria vital o papel de meu amigo querido, compadre e esplêndido jornalista Nirlando Beirão, com quem tive a honra de contar na redação de Playboy como editor especial", continua Ricardo Setti. 

Beirão escrevera, para Adriane, o livro-depoimento "No Caminho das Borboletas — Meus 405 Dias ao Lado de Ayrton Senna" (Editora Caras, 1994, 300 páginas), grande best-seller daquele ano, e era merecedor da confiança da estrela. 

A primeira reunião de Setti com Adriane se deu no apartamento de Beirão em São Paulo, e com sua presença. Ao fim da reunião, como forma de aproximação, deu uma carona a ela até a casa do piloto Rubens Barrichello, de quem se tornara amiga próxima. 

O cachê finalmente negociado com os advogados de Adriane depois de alguns meses alcançaram valor inédito até então – não obstante seja difícil fazer contas exatas com as sucessivas trocas de moeda ocorridas no Brasil desde a fundação de Playboy, em 1975, até então. 

Uma edição planejada para ser histórica 

"Por todas as razões, sobretudo pelo pique de celebridade em que estava Adriane, alvo de enorme atenção da mídia, aquela edição estava planejada para ser histórica. Queríamos uma edição luxuosa, de campeões. A entrevista principal, repleta de revelações inéditas, era do campeoníssimo Emerson Fittipaldi. Uma das reportagens contava Pelé funcionando como ministro do Esporte do presidente Fernando Henrique. Outra, narrava os bastidores de um dos hotéis mais suntuosos do mundo, o Plaza Athenée, em Paris", lembra-se Setti. 

Nada podia dar errado

Ariani Carneiro, editora de Fotografia da revista e braço direito de Setti em matéria de contratação, pré-produção e feitura de ensaios, também estava apreensiva, apesar de que, embora jovem, já tivesse boa experiência em viagens ao exterior — havia realizado trabalhos inclusive no distante e idílico Taiti. 

Reprodução de página da edição de 20º aniversário de "Playboy" com parte de foto do ensaio de 26 páginas com Adriane Galisteu 

O contrato com Adriane, muito acima do que costumavam pagar a estrelas, havia sido negociado por Ricardo Setti, pessoalmente — fugindo à regra geral segundo a qual as negociações eram iniciadas e no mais das vezes concluídas por Ariani, sempre em contato permanente com ele. 

Num intervalo da feitura do ensaio, a editora Ariani oferece um creme hidradante para Adriane, no terraço do hotel Heliotopos (Foto Sandra Jeha) 

Ao valor do contrato se acresciam, ainda, os custos de deslocamento de uma grande equipe para realizar o ensaio no exterior – além de Duran, a editora Ariani Carneiro, a assistente de fotografia de Duran, Sandra Jeha, a produtora Florise Oliveira, o cabeleireiro Marco Antonio de Biaggi e o maquiador Kaká Moraes. No grupo se incluiria também a à época agente de Adriane, Cristina Moreira.

Nove dias de trabalho 

As apreensões de ambos, porém, logo se dissiparam quando atravessaram uma espécie de grande portal do paredão rochoso que parece proteger Santorini, sobra ancestral de um vulcão extinto, que dá acesso à esplêndida baía de águas azul-marinho, emoldurada por escarpas coalhadas de casas brancas brilhando ao sol — nada mais grego, e mais magnífico. 

As atividades começaram no dia seguinte, e se estenderam por 9 dias. Em seus 15 anos de Playboy, Ariani Carneiro não se recorda de tarefa que demandasse tanto tempo. Tenaz em seu objetivo de obter o máximo de originalidade no ensaio, Duran havia previamente anotado uma série de ideias num caderninho — não, não era um iPad… — que costuma levar consigo. 

As fotos de Duran — peculiares, surpreendentes, sensuais 

Peculiares, surpreendentes, essas ideias foram se materializando em fotos: Adriane nua, de sandálias brancas de salto alto, passando roupa ao ar livre.
Ou, a céu aberto, banhando-se numa bacia (veja reprodução tirada da revista de agosto de 1995 abaixo). 

Reprodução parcial da página dupla de um exemplar da edição de agosto de 1995 mostrando, na página da esquerda, Adriane Galisteu, nua, ao ar livre, como se se banhasse numa bacia 

Estendida, de olhos fechados, sobre a cúpula curva do chalé do hotel em que a equipe se hospedou, o Heliotopos. Passeando sua nudez no convés de um pequeno iate alugado por Ariani. Um close de uma mini-calcinha branca dependurada no varal, Adriane bebendo sensualmente leite de um pires. 

“Foto de depilação? Nem pensar! — reagiu Adriane“ 

Os pressupostos dos ensaios de nu são quase sempre os mesmos”, ressalta o fotógrafo. “O diferencial é a sensação de intimidade que as fotos possam produzir”, ensina.

Aí, e por isso, Duran viria com a proposta de algo “extremamente íntimo” – inspirado em cena rápida e improvisada de sua vida privada, durante uma viagem – que se tornaria um marco na história da revista: que tal se ela se deixasse fotografar depilando, com um barbeador de lâminas, o púbis? 

– Nem pensar! – reagiu Adriane. 

Experiente, o fotógrafo jogou a isca: 

– OK, sem problemas. Então eu deixo essa foto para fazer em outro trabalho, com outra estrela.

A estrela muda de ideia 

Ele sabia que ela ficaria ruminando aquilo, e não teve erro. No último dia, Adriane, que já se acostumara ao profissionalismo e ao bom gosto de Duran e se sentia visivelmente mais segura, voltou ao assunto: 

– Olha, Duran, pensei bem e aquela ideia pode ser legal. 

A foto foi feita em uma locação providenciada por Ariani — o espetacular hotel Tisouras, também debruçado sobre o mar. 

Hotel elegante e badalado, que tinha entre seus frequentadores um dos papas mundiais da moda, o italiano Gianni Versace.

Reprodução parcial da página de um exemplar da edição de agosto de 1995 de "Playboy" com a foto mais polêmica da história da revista 

De propósito, Duran criou um quadro inverossímil. 

Adriane não se pôs a depilar-se no banheiro, mas num cenário inusual – uma saleta ornada com quadros, assentada sobre um sofá de couro branco. 

Tampouco estava nua, e sim de salto alto, blusa de seda azul, faixa branca nos cabelos louros, um anel de ouro e pedra preciosa no dedo mínimo esquerdo, naturalmente sem roupa íntima, com espuma de barbear sobre o púbis e um barbeador comum na mão direita.

Reprodução de página dupla de exemplar da revista de agosto de 1995 mostrando, à esquerda, foto de Adriane debruçada sobre a paisagem espetacular de Santorini e, na página da direita, outra célebre foto, a da estrela bebendo leite de um pires 

A foto da “deusa loura nua na Grécia”, como dizia a chamada de capa da revista, virou notícia no dia em que a edição veio à luz, atingindo uma venda superior a 1 milhão de exemplares (bancas e assinaturas) e batendo todos os recordes da revista em seus à epoca 20 anos de existência no Brasil. 

O colunista Zózimo Barrozo Amaral, que ditava moda e modismos no (infelizmente) extinto Jornal do Brasil, logo a denominou de “raspadinha” – alusão maliciosa aos bilhetes da loteria instantânea, ainda muito em voga naquele 1995. 

O tema atiçou uma torrente de manifestações, que incluíram de psicanalistas a programas de fofoca e até mesas-redondas na televisão, do escritor Luis Fernando Verissimo a revistas semanais. 

Adriane e Playboy não saíam do noticiário. Na festa dos 20 anos da revista, com um show do cantor Bobby Short para 1.200 convidados no Teatro Municipal, em São Paulo, uma multidão que precisou ser contida por um cordão de segurança se aglomerou na porta para ver, aplaudir e saudar aos gritos a estrela, vestida num longo branco. 

Na Folha de S. Paulo, que tratou do caso várias vezes, o exigente colunista Marcelo Coelho sentenciou, resumindo tudo: “Uma foto antológica”.

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